• estudo realizado por:

    Maria Aparecida Mendes

  • Maria Aparecida Mendes

Diagnóstico

Proteção das defensoras(es) de direitos humanos Quilombola na Amazônia legal, Cerrado e Caatinga.

1. Apresentação

Este relatório é referente às atividades desenvolvidas no período de maio a novembro de 2021, resultante da consultoria para elaboração de diagnóstico sobre proteção dos quilombolas, defensores e defensoras de direitos humanos na Amazônia Legal, Cerrado e Caatinga.

2. Metodologia do trabalho

A concretização das atividades nessa primeira etapa da consultoria se constituiu em aprendizados que definirão ações futuras. Em tempo da pandemia do coronavírus, que impôs o distanciamento. Nesse sentido, considerei as condições que cada um tem de acesso a informações. Então, troca de mensagens de WhatsApp, chamada de vídeos, reunião pelo (Google Meet,) formulário Google, foram os meios utilizados para conversar. Como apoio, lancei mão de documentos disponíveis no site da CONAQ, Terra de Direitos sobre ações de defesa dos direitos quilombolas.

3. Atividades realizadas

A primeira reunião (remota) aconteceu a convite da coordenação do projeto e contou com a participação de todos os consultores, no dia 27 de maio de 2021.

No caso do diagnóstico sobre proteção dos quilombolas defensores e defensoras de direitos humanos, foram realizadas cerca de 30 conversações remotas, com 24 lideranças de 11 estados. A tabela abaixo tem a finalidade de detalhar quais estados e quantas pessoas participaram.

Além do diálogo com as lideranças quilombolas, foi possível estabelecer contato com representações das organizações reconhecidas como parceiras do movimento nos estados.

Dia 12 de julho, a convite do Sr. Manoel Oliveira, representante da CONAQ em Alagoas, participamos de uma reunião com o Dr. Diego Alves, defensor público da União-DPU, e a Dra. Márcia Danyelle também da DPU. A finalidade dessa reunião era dialogar sobre as demandas atuais dos quilombos do estado. Na ocasião, o Sr. Manoel explicitou a situação de violação dos direitos das comunidades quilombolas da região.

3.1. Entendimento sobre violência

Dialogamos sobre o que as lideranças entendem como violência. Em resposta a essas perguntas, uma variedade de definição foi apresentada.

“… há 12 anos, o Sr. Ezequiel Sena Fontes Júnior pratica violação de direitos humanos, invade as casas das pessoas, intimida com ameaça as pessoas de morte, chama as famílias de vagabundas. Todo tipo de atrocidade que você imaginar ele praticava na Comunidade do Quilombo de Cedro. Ele mata os animais das famílias, proíbe as pessoas de construir, inclusive já derrubou casas de quilombolas.[…] O delegado agrário encaminhou um pedido à justiça, pedindo ao delegado que proibisse a mim e outras 12 lideranças da Comunidade de Cedro a não nos aproximarmos desse fazendeiro, ou seja, ele viola o nosso direito e os aplicadores da justiça nos punem como se nós fôssemos os criminosos.”

Maria Antônia Teixeira Dias, (02/08/2021)

O relato é um exemplo de manifestação de violência, mas também mostra o quanto as instituições que legalmente têm o dever de zelar pela proteção dos cidadãos se valem do poder para potencializar as opressões.

Para facilitar a compreensão dos resultados, seguem abaixo os subtemas.

3.2. Tipos violência a que defensoras e defensores estão submetidos

As lideranças estão submetidas ao conjunto de violências e, para mitigar os riscos de morte, elas são obrigadas a tomar decisões que acabam por restringir o próprio direito de ir e vir. Dessa forma fica nítido o quanto a opressão ganha formato de ondas que operam mesmo quando o opressor está fisicamente ausente.

Nesse caso, para não se expor ao perigo de se encontrar com o fazendeiro e o filho, ela teve que alterar a dinâmica do exercício do seu ativismo.

3.3. Principais violadores de direito

Os opositores da nossa luta têm a máquina na mão e constroem alianças com as mais diversas representações, inclusive do Estado. Não se sentem constrangidos em adotar estratégias para cometer atrocidades, como aponta o relato de uma das lideranças que vive hoje em completo isolamento domiciliar.

“Fizeram uma audiência pública na Câmara dos Vereadores, com a presença da mídia local, criaram uma campanha de difamação contra mim no município de Cabrobó. O meu maior medo é porque eu conheço essas pessoas e sei do que elas são capazes.”

Joana Angélica. (08/07/2021).

3.4. Principais consequências

A tabela abaixo retrata o conjunto de consequências das violações que recai com maior intensidade sobre as lideranças quilombolas defensoras de direitos humanos. Entre elas destacam-se: descrédito nas instituições de segurança pública, enfraquecimento da luta local, conflitos internos, adoecimento mental, cooptação de pessoas nas comunidades. No caso das mulheres, a situação se torna mais delicada porque a violência imposta pelo sistema racista, capitalista, patriarcal interfere no cotidiano das famílias e se manifesta em forma de violência contra as mulheres.

3.5. Medidas adotadas

As principais medidas relacionadas ao Poder Público são materializadas pelas denúncias feitas especialmente ao Ministério Público e a Defensoria Pública. É importante ressaltar que do universo de trinta pessoas, quatro registraram queixa nas delegacias de polícia dos seus municípios. Esse fenômeno ocorre porque as lideranças não se sentem seguras com as abordagens ao serem recebidas em tais ambientes. A maioria prefere buscar apoio de outras organizações, com destaque para o Ministério Público. Dessa forma, as próprias comunidades têm adotado medidas importantes de proteção das suas lideranças.

As tabelas abaixo retratam o que mais se destacou nas falas das(os) participantes.

3.6 Medidas individuais de proteção no cotidiano de luta

3.7 O que se espera do poder público

Todos os participantes da pesquisa apontam a necessidade de maior atenção aos quilombolas defensores de direitos humanos. Entre as medidas sugeridas, destacam-se a necessidade de formação dos aplicadores da legislação quilombola, a expansão e aprimoramento dos programas atuais de proteção. Isso porque geralmente as unidades de proteção estão localizadas nas capitais, distante de muitos quilombos. Segundo elas, em algumas situações, são instaladas câmeras filmadoras nas residências das lideranças ameaçadas. No entanto, com o passar do tempo elas são danificadas e o órgão responsável não envia técnico para fazer a manutenção dos equipamentos. Em outras situações, o serviço de proteção apenas registra o nome dessas pessoas, mas não as informa de que forma acontece a proteção.

3.8. Nossos parceiros

Para enfrentar as violações de direito, as(os) participantes apontam várias organizações que atuam como parceiras, conforme tabela abaixo.

3.9. Municípios com maior incidência de violência contra os quilombolas defensores de direitos humanos

3.10. Estado com Serviço de Proteção aos Defensores e Defensoras de Direitos Humanos

Sobre o Serviço de Proteção aos Defensores e Defensoras de Direitos Humanos, apenas os representantes dos estados abaixo têm conhecimento da existência. Das 34 lideranças, 5 estão incluídas em programas de defensores e defensoras de direitos humanos, no entanto, todos se queixam das fragilidades dos programas. Nas palavras da Sra. Antonia, quilombola do Maranhão, “o programa não protege, orienta às lideranças a não andarem sós, a evitarem ambientes considerados de risco, e a ficarem em casa. Sequer notificam os promotores das violações, ou seja, contribui para limitar a ação das lideranças na luta em defesa do coletivo quilombola”. A sua fala vai ao encontro da pesquisa realizada pela CONAQ e Terra de Direito publicada em 2018, sobre racismo e violência contra quilombos no Brasil.

Os relatos apontam que o ódio às lideranças quilombolas se acentua quando elas levantam a voz contra as violações dos direitos do povo. Em todos os lugares as lideranças estão em risco, mas alguns municípios têm as violações potencializadas.

Quilombolas inseridos no Programa de Proteção de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos 5 = 15% estão inseridos.

29 = 85% não tem conhecimento se existe.

Autorização à CONAQ para utilizar as informações acima prestadas para produção de cartilhas, protocolo de segurança e denúncias em instituições internacionais responsáveis pela segurança dos defensores de direitos humanos.

34 = 100%

Autoriza que seu nome seja evidenciado ou prefere nome fictício?

4. Oficina para defensoras e defensores de direitos humanos

A oficina presencial realizada nos dias 22, 23, 24 de outubro, em Brasília, se constituiu como importante ação da consultoria. Essa atividade contou com a participação de 30 lideranças quilombolas, representantes dos diversos estados. Contamos com a colaboração da Organização Terra de Direito, nas pessoas de Luciana Pivato e Alana. Assim como a contribuição da Sociedade Maranhense de Direitos Humanos e Escola de Ativismo: elas realizaram palestra importante sobre os Programas de Defensoras e Defensores Direitos Humanos e sobre os riscos e possibilidades de proteção decorrentes do uso das redes sociais digitais.

Entre as ações realizadas em defesa dos direitos quilombolas com publicações recentemente disponibilizadas, destaco: a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental com Pedido de Medida Liminar (ADPF), os livros “Racismo e violência contra quilombos no Brasil” e “Vidas em luta: criminalização e violência contra defensoras e defensores de direitos humanos no Brasil”, e a dissertação intitulada: “Da diáspora negra ao território das águas: ancestralidade e protagonismo de mulheres na comunidade pesqueira e quilombola”.

5. Narrativas dos participantes por estados

Maria Antônia Teixeira Dias, (Antônia Cariongo) Quilombo Cariongo, Santa Rita, Itapecuru Mirim, Maranhão

Sou quilombola do Quilombo Cariongo, [1] município de Santa Rita. Esse é o nome do quilombo onde nasci e me criei, sou a quinta geração do meu povo.Como militante eu adotei o nome de Antônia Cariongo, mas meu nome é Maria Antônia Teixeira Dias.

Sou uma liderança, estou à frente de um movimento chamado Comitê de Defesa dos Direitos do Povo Quilombola de Santa Rita Itapecuru Mirim, no Maranhão, no qual atuo como coordenadora. Tem como objetivo tratar sobre as questões de violações de direitos, fazer denúncia e acionar a justiça.

Em decorrência da nossa luta, eu, o irmão Nilo Pereira, a irmã Lucilene e Sandro, quilombola de Cedro no Maranhão, sofremos ameaça de morte feita pelo procurador federal do DNIT, que é o Sr. Ezequiel Sena Fontes Júnior. Eu tive contato com ele em 2018 aqui no Maranhão, quando começou o conflito com o DNIT na obra de duplicação da BR 135. Eles queriam iniciar a obra dentro de seis territórios sem consulta prévia. Nós intervimos e denunciamos à justiça. Eu iniciei um trabalho social dentro da Comunidade Quilombola de Cedro. Lá eu o conheci e após esse primeiro contato, que não foi um dos melhores, ele passou a nos ameaçar.

Por incrível que pareça, eu nunca imaginei na minha vida que ele tinha uma fazenda dentro do território do Cedro. Mas, fiquei sabendo que há 12 anos ele pratica violação de direitos humanos. Ele comete todo tipo de atrocidade que você imaginar.

Quando eu comecei a visitar as famílias lá em Cedro, ele disse que eu estava atrapalhando e que ele iria mandar dar um jeito em mim. Uma semana depois dessas ameaças eu fui surpreendida com motoqueiros rondando a minha casa. Foi um período muito difícil para mim, principalmente para a minha família.

Hoje a minha vida de militância tem várias restrições. Eu e os outros companheiros que também fizemos parte de um programa de proteção aqui no Maranhão. Eu sempre digo, eu tenho um Deus e preciso me agarrar nele porque só ele pode nos livrar.

Estou em um serviço de proteção, mas ele é muito restrito, não tem muito a oferecer. Por exemplo, hoje a minha casa fica bem próximo, a menos de 25 metros, da BR 135. Então, estou em um local de grande visibilidade, muito exposta. A minha casa é muito simples, não tem grade, nós não temos câmeras em volta dela nem na comunidade para filmar nada. Eu venho relatando isso para o programa de proteção já faz um tempo.

A minha ideia seria construir uma casa mais para o interior da comunidade onde eu ficasse mais escondida. O programa aqui no Maranhão assumiu o compromisso de instalar duas câmeras, uma ficará na frente da minha casa e a outra nos fundos, mas não sei quando nem por quanto tempo.

A circulação dos motoqueiros em volta da minha casa foi presenciada por mim uma vez e outras vezes por pessoas que me alertaram. Isso é muito perigoso, eu posso estar despreocupada dentro de casa e de repente ser surpreendida com a invasão desses motoqueiros.

Apesar de eu já ter tido um contato não amistoso com o procurador de justiça do DNIT, por conta da obra de duplicação da BR-135, iniciei o trabalho dentro do Cedro e foi exatamente nessa comunidade/território que fui ameaçada por ele. Os crimes que ele cometeu estão todos registrados na delegacia agrária em São Luís, porque aqui em nosso município a gente não consegue registrar um boletim de ocorrência.

Eu não tenho nenhum tipo de apoio da parte do setor público do município onde moro. Nenhum defensor público. O único apoio que tenho é das outras lideranças que estão do meu lado, no meu trabalho dia a dia e que tem esse cuidado de me proteger. Se eu for para uma comunidade, tem sempre alguém me acompanhando, não me deixam só.

O fazendeiro que me ameaça de morte geralmente está na Comunidade de Cedro nos finais de semana junto com o filho. Em vista disso, eu já nem visito mais o quilombo nos finais de semana. Eu tenho que ir durante a semana e as minhas reuniões não são anunciadas com antecedência. Só pessoas de confiança, ou então só quando eu chego se faz a mobilização dos participantes para que eu não fique tão exposta em relação a eles.

Todos os boletins de ocorrência registrados na delegacia agrária de São Luís até hoje não tiveram nenhum desfecho. O único encaminhamento que teve lá depois de tudo isso foi a solicitação por parte do delegado agrário à justiça pedindo aos delegados que proibissem a mim e outras 12 lideranças da Comunidade de Cedro de nos aproximarmos desse fazendeiro, ou seja, ele viola o nosso direito e os aplicadores da justiça nos punem como se nós fôssemos os criminosos. Ele também pede ao juiz que proíba qualquer família de construir casa de alvenaria na comunidade.

Isso é uma vergonha para o nosso estado e para o país, os governantes não garantem proteção a ninguém. Os números são alarmantes, no último mês, quatro lideranças foram assassinadas nesse estado.

Essas notícias acabam com o psicológico da gente, isso nos mata aos poucos. E o que nos deixa mais indignada é porque o Estado não toma providência nenhuma para evitar que isso aconteça. Então, é horrível, o governo do estado deveria se envergonhar, não só o governo do estado, mas o Brasil inteiro.

O Programa de Proteção de Defensores e Defensoras de Direitos Humanos do Maranhão está vinculado à Secretaria de Direitos Humanos, com participação popular (SEDIHPOP), e tem como entidade gestora a Sociedade Maranhense de Direitos Humanos.

nesse programa de proteção que estou inserida, mas ele não garante proteção, a atuação é muito pouca. Eu penso que se eu sou uma liderança ameaçada de morte e outras pessoas dependem do meu trabalho, eu não posso ser impedida de exercer o meu trabalho. Acho que a proteção não se resume em dizer: não entre em lugar onde o seu opressor está, ou lugar que está em conflito.

Na verdade, o programa de proteção orienta, me diz para eu não sair à noite, para eu não passar onde tem conflito. É um programa que dá orientação, mas isso não quer dizer que está me protegendo. Outra coisa que o programa faz é, se os conflitos se acirrarem, eles tiram a pessoa de casa, do convívio comunitário, do município, e vão te levar para outro lugar. Então, isso vai fazer com que a gente morra mais depressa psicologicamente.

Então, eu acho que o Estado tinha que garantir a minha proteção 24 horas. Na verdade, atualmente o programa não tem como fazer isso, portanto, por muito medo e por eu não ter nenhum apoio por parte do município, eles estão se mobilizando para fazer a instalação de câmeras para monitorar a minha casa. Mas eu tenho que sair, eu não posso ficar o resto da minha vida trancada dentro de casa, tenho que exercer o trabalho que gosto, que é defender os direitos.

Nas comunidades onde tem os maiores conflitos, a situação é horrível. Cedro é um exemplo de comunidade que as pessoas parecem não ter paz.

Na maioria das vezes, a própria comunidade é a principal promotora da proteção das defensoras de direitos humanos. Faz- se sempre uma vigília na casa da liderança, a gente tem horários para sair e voltar para casa, evitando sair à noite. Quando eu quero ir para uma comunidade eu digo: “olha eu quero ir para a comunidade tal”. Peço sempre a alguém de muita confiança para me levar. Sempre troco de transporte, volto em horários diferentes, muitas vezes por caminho diferente também. Enfim, vamos adotando essas medidas.

Então, como se vê, ainda que a intenção seja boa, o serviço de proteção tem que nos manter, a pessoa “beneficiária”, em prisão domiciliar, mas a partir do momento em que você se prende dentro de casa, o opressor se fortalece. Porque o opressor quer é que você pare sua luta. Eu não parei a minha luta, claro, hoje eu saio menos, eu pratico menos a minha militância. Sou muito cuidadosa, principalmente pela minha parte.

Para se ter ideia, eu só consegui processo na justiça contra as ameaças que sofro porque consegui através do Fundo Brasil um recurso de 15 mil para pagar um advogado por três meses para fazer um levantamento na justiça, sobre a irregularidade cometida por esse procurador. Existe um monte de processo desse fazendeiro contra as lideranças de Cedro que estão no serviço de proteção.

Eu paguei três meses ao advogado e ele conseguiu dá entrada numa ação na justiça, mas, como o dinheiro acabou, estou sem assessoria para continuar o processo. O estado não disponibiliza um advogado, não te dá um apoio jurídico para que isso ande.

O que eu posso fazer é ligar para a delegacia e dizer que mande uma viatura até a comunidade onde está acontecendo isso ou aquilo. Em uma ocasião dessas, respondem que a viatura não está na cidade, é isso que eles dizem. É assim que funciona, então não existe proteção por parte do Estado e por parte do serviço de proteção existe apenas orientação. Eu não estou falando das pessoas que trabalham no programa, estou falando dos governos que, aliás, eu nem sei se esse programa é mantido pelo estado. Imagino que seja um projeto à parte.

Diante do cenário que está posto, precisamos fortalecer a nossa luta, levar informação para a população que se encontra nas comunidades. Precisamos formar futuras lideranças que entendam o que é violação de direitos humanos, o que é política pública social e o que é política partidária. As comunidades precisam de oficinas que falem sobre esses assuntos. As lideranças têm que saber como buscar os seus direitos e do seu povo. Porque quanto mais sementes espalhadas nos quilombos do nosso estado, mais forte seremos para enfrentar o sistema opressor. A partir do momento que a gente tiver essas sementes espalhadas em todos os lugares, a gente vai ter o fortalecimento muito grande da nossa luta.

As famílias que vivem nos quilombos precisam de palestras que tratem sobre direitos humanos, porque elas precisam entender que é preciso estar junto das lideranças. Tem que estar na reunião para entender o que está acontecendo dentro do seu território ou sua comunidade. Nós mulheres precisamos identificar que violência doméstica não é só a pancada que o homem dá, mas a violência psicológica, desrespeito dentro de casa.

Não só as lideranças, mas toda comunidade precisa de formação constante. Além do mais, nós que estamos nessa luta precisamos de suporte para sobreviver. Eu sou uma mãe de família com três filhas, duas já são adultas, mas uma pequenininha de oito anos que eu preciso ainda criar.Eu preciso me manter de alguma forma e por isso preciso sair da minha casa porque o Estado não consegue me manter para eu ficar dentro da minha casa.

Eu preciso militar porque é indo a uma comunidade, fazendo uma reunião, ajudando meus companheiros a registrar um boletim de ocorrência, acompanhando até uma delegacia, ao Iterma, ao Incra que eu ganho dos amigos arroz, farinha, peixe, maxixe, quiabo, abóbora. Então a gente precisa de um meio para sobreviver.

Quando eu passei por situação de ameaça, fiquei com meu psicológico acabado e toda vez que eu vejo uma liderança sendo assassinada no Maranhão isso mexe muito com o meu psicológico. Mas eu reafirmo o meu pensamento em Deus porque o meu papel na terra é ajudar os que mais precisam, então a gente leva a vida assim.

Eu, enquanto coordenadora do comitê e todas as lideranças que compõem ele, temos como principais parceiros a CONAQ, Centro de Cultura Negra do Maranhão, da ONG Terra de Direitos, ela tem advogado e é esse comitê que cuida do processo da BR 135. Assim como os advogados do Centro de Cultura Negra do Maranhão, eu tenho recebido o apoio do Fundo Brasil de Direitos Humanos. Como falei antes, duas vezes eu já acessei o projeto do Fundo Brasil e fui contemplada com o apoio deles. Então, são esses apoios que eu tenho.